segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Brasilia dia 4


Brasilia dia 4…

Episodio de hoje… Saindo da Zona de Conforto.

Toda a estratégia de vôo até agora tem se baseado em conforto, ter uma rodovia logo abaixo para facilitar o resgate, passar próximo a civilização em caso de problema, estar ao alcance do sinal de telefone celular, entre outras coisas.

Fazendo uma analise do vôo anterior cheguei a conclusão de que estava desperdiçando uma série de recursos a meu dispor para justamente momentos mais tensos, estou voando asa de alta performance, usando um casulo de pouco arrasto, um rádio de ondas curtas no carro e na asa, GPS, barrinhas de cereal e 2 litros de água

A rota anterior me forçava a fazer um L gigantesco para chegar na esplanada, 120Km de vôo justamente por causa das facilidades logo abaixo enquanto que, se tirasse em linha reta para Brasilia precisaria "apenas" de 80 Km de vôo. O problema dessa rota é que ela me colocava distante de rodovias, sobre alguns povoados perdidos no centro-oeste brasileiro, sem sinal de celular e próximo da temida serra do Maranhão, terra de ninguém.

Acordei hoje disposto a sair da zona de conforto, jogar pra trás e me perder no azul.

A previsão era muito boa, índice térmico alto, térmicas fartas, e vento soprando de Leste que da rampa empurra em uma linha reta para Brasilia.

Decolei as 13:15 e mandei imediatamente para a direita onde a primeira boa notícia do dia aconteceu, tomei um chute pra cima de 5.1m/s tão liso que parecia um afago porem o topo dela estava muito baixo ainda 2500m, o teto subiria ao longo do dia mas por enquanto teria que me contentar com isso.

E vamos nos, dei de cauda para o vento e fui em direção a BR-020 até aí era a mesma coisa que os vôos anteriores. 

Neste ponto o primeiro momento tenso do vôo, encontrar a próxima termica para continuar o vôo. Fui seguindo a BR-020 na esperança de que algum caminhão, carro, trator desprendesse uma térmica que me jogasse pra cima, por longos minutos não passou carro algum na rodovia e eu ia ficando baixo até que vejo um trator a minha direita levantando porreira e decido que é lá ou chão.

Nem cheguei perto tomei pra cima em uma bicuda que me fez brigar com a asa por bom tempo até abandona-la a 2800m pra não cansar. Mandei o resgate pra planaltina de goias a 40 km dali regulando a transmissão de sinal a toda força pra gente conseguir se falar, dei de cauda para o vento de novo, CG em 3/4 e fui em frente.

Lá pelas tantas olhei para trás e a BR-020 era apenas um fio dental, São Gabriel a minha direita estava a 60Km a estrada para planaltina a esquerda estava a 15km de distância e Planaltina 20 a minha frente, olhei pra baixo e só vi arados enormes, estava praticamente no meio do nada. Lembrei de um email na lista de planadores em que um piloto durante um campeonato no interior da Bahia pousou em uma plantação destas e foi na direção das colheitadeiras para pedir ajuda ao operador quando descobriu que todas elas eram automáticas e operadas via satélite de uma central kilometros dali. Ele precisou forçar e entrada na maquina e aparecer na câmera para uma guarnição de segurança da fazenda aparecer de helicóptero para investigar o ocorrido.

Peguei uma sobre um arado recem trabalhado que me deu altura suficiente para me permitir chegar na beirada da cidade de planaltina, sobre o que parecia ser uma olaria, ufa a primeira parte da travessia "faca nos dentes" estava concluída, agora vinha a segunda parte, atravessar Planaltina.

A cidade não era lá grande coisa mas tinha a sua esquerda a reserva ecológica das águas emendadas e a sua direita a serra do maranhão, circunda-la não era uma opção, pela serra nem pensar e pela reserva bem… é uma reserva de fauna e flora nativa, pousar lá me traria problemas legais, então sem escolha comecei a procurar térmicas na borda da cidade. O pessoal de Brasilia sempre diz que a reserva era um ótimo gerador de térmicas mas baixo do jeito que estava ficando eu certamente terminaria minha aventura no meio do mato.

Há cerca de 500m achei um autêntico canhão que me levou a  2800 de novo, fiz minhas contas olhei para o outro lado da cidade e para a reserva e parti para cruzada.

Pra minha grata surpresa a cidade em si é um enorme gatilho de térmica, eu praticamente não perdi altura cruzando a cidade, muito pelo contrário ganhei altura. Comecei o sobrevôo de planaltina a 2800 e sai a 3200, neste ponto comecei a acreditar que conseguiria chegar na esplanada pois comecei a avistar o lago Paranoá no horizonte, estou na metade do caminho pensei.

O festival de térmicas e a orgia de sustentação duraram até eu cruzar a reserva, cheguei do outro lado acelerando pra não deixar a asa subir, o frio estava insuportável.

Cheguei em Sobradinho feliz por ter deixado a parte mais selvagem do vôo pra trás, agora tinha uma cidade grande, rodovia, sinal de celular, resgate ao alcance e Brasilia estava no visual, lembrei de um colega voador que um dia disse, "a sorte sempre acompanha o audaz".

Fui andando, beliscando algumas bolhas de 1.5 e continuando em frente na esperança de pegar algo mais forte e consistente mas não encontrando nada, o fato me deixou preocupado mas uma olhada no relógio logo deu uma explicação, eram 15:30, o sol não estava mais a pino, as térmicas estavam ficando fracas tinha que acelerar.

Em cima da guerra eletrônica ( um quartel da polícia ) cheguei a um ponto decisivo, cruzar o lago paranoá mas estava muito baixo. Decidi ir na direção do lago na esperança de que o contraste terra/agua estivesse desprendendo alguma ultima coisa no fim do dia, na pior das hipóteses pousaria em alguma mansão nas margens do lago, fiquei impressionado com a área verde próximo a eles.

A aposta deu resultado e consegui uma pequena bolha de 1.5 que girei durante quase 20 minutos me colocando no cone de planeio para a esplanada me permitindo as fotos desse vôo!

Fiquei impressionado comigo mesmo neste vôo, o efeito que a necessidade de acertar a próxima térmica, a necessidade de não errar o ciclo, de não errar o planeio fazem com a cabeça de uma pessoa quando ela não outra opção a não ser acertar.

Amanha tem mais

H2

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