Considerações da temporada de Brasilia...
6 anos depois da minha última visita ao cerrado, devo dizer que esta foi melhor que a anterior por um motivo muito simples e ao mesmo tempo complexo… Minha preparação neste ano foi melhor!
Diferente de outros locais que voei no interior de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais o cerrado brasileiro guarda características que precisam ser levadas a sério para que a empreitada não acabe cedo ou de maneira trágica.
A primeira característica é o clima seco. Brasilia com o lago Paranoá e suas inúmeras mansões com piscina já é seco, a rampa na borda do planalto central é muito mais seco. Os pulmões precisam de humidade para trabalhar e na falta desta no ar eles roubam água do resto do organismo. Na rampa do vale do Paranã o simples ato de respirar dava sede. Consumia diariamente 3 litros de água. 1 durante a montagem da asa e antes da decolagem, 1 durante o vôo e 1 após o pouso e ainda assim no final do dia urinava muito pouco. O consumo de água era feito de 15 em 15 minutos para manter o equilíbrio hídrico do corpo, sentir sede significava que estava perdendo água mais rápido do que conseguia repor isso eu não podia permitir.
A segunda característica relacionada ao clima é a insolação. O planalto central é basicamente uma região sem acidentes geográficos e de vegetação predominantemente árida, o sol queima você da ponta do dedo mindinho do pé até a ponta do fio de seus cabelos da hora que nasce até a hora que se põe, ele não se poe atras de uma montanha, só no horizonte quando o dia termina. Protetor solar, chapéu e óculos são essenciais, a natureza aqui é agressiva e passar mal em vôo é garantia de problemas. Usei 3 vidros de protetor solar 50 nesta temporada, aplicava de manha, e antes de decolar.
A terceira característica é social. Diferente das grandes cidades ou dos estados mais desenvolvidos da federação, o cerrado é uma região pouco habitada, pouco desenvolvida, entrecortada por fazendas gigantescas em que freqüentemente não uma alma viva num raio de kilometros e mais importante SEM SINAL DE CELULAR. Por isso comunicação com as equipes de apoio é importantíssimo. Rádio de ondas curtas e conhecimento das freqüências de emergência para se manter constantemente em contato com o resgate pode ser a diferença em caso de problemas pois como um experiente colega voador ma vez mencionou: "Aqui no sertão a coisa TEM QUE DAR CERTO!"
A ultima é de ordem técnica. A natureza do cerrado é agressiva tanto em terra quanto no ar, a falta do efeito apaziguador da humidade na atmosfera permite a geração de térmicas que são verdadeiros canhões e de descendentes que tornam a própria força da gravidade irrelevante. Não é ambiente para pilotos com pouca experiência ou que acabaram de atualizar qualquer parte do equipamento ou com mentalidade de vôo de final de semana. É necessário preparação técnica e planejamento, esta semana de vôos em brasilia começou 2 meses antes, conversas quase semanais com o resgate me ajudaram a planejar as tiradas, mapear pousos e rotas.
O vôo livre é o esporte que melhor me proporciona oportunidades de interação com a natureza de formas que não se consegue por outros esportes. O efeito que as variações na vegetação, pressão do ar insolação tem no vôo e o desafio de ler todas essas variáveis para continuar em vôo me proporciona desafios de ordem intelectual que dificilmente encontro em outra faceta de minha vida.
Costumo dizer para os mais chegados que tomei 5 decisões certas na vida do qual me orgulho muito uma delas foi aprender a voar.